Explosões no Sri Lanka: o desconhecido grupo islâmico apontado como responsável pelos piores ataques desde 11 de setembro
Autoridades cingalesas dizem que bombas em hotéis e igrejas, que deixaram pelo menos 310 mortos, teriam sido colocadas por pequenos grupos formados por militantes muçulmanos jovens que, no ano passado, destruíram estátuas de Buda no país.
Por BBC
Soldados fazem guarda em uma igreja atingida por explosão em Negombo, no Sri Lanka, no domingo (21) — Foto: Reuters/Stringer
Até domingo passado, poucas pessoas, mesmo no Sri Lanka, sabiam
quem era o National Thowheed Jamath (NTJ), o pequeno grupo extremista
islâmico responsabilizado por um dos piores ataques extremistas no mundo
desde 11 de setembro de 2001.
O grupo foi apontado por autoridades do país como responsável pelas oito explosões
que deixaram mais de 310 mortos e 500 feridos e devastaram hotéis e
igrejas cristãs no domingo de Páscoa, na capital, Colombo, e em outras
duas cidades.
A autoria dos atentados foi reivindicada nesta terça-feira, no entanto, pelo grupo extremista autodenominado Estado Islâmico — o que deve ser visto com cautela, conforme alerta um dos correspondentes da BBC no Sri Lanka.
O grupo costuma reivindicar a autoria dos ataques logo depois que
acontecem, publicando fotos dos autores na agência de notícias Amaq,
vinculada a eles. E, de acordo com a agência Reuters, não foi
apresentada nenhuma evidência até agora.
Antes de o Estado Islâmico se manifestar, o porta-voz do governo,
Rajitha Senaratne, culpou o NTJ e afirmou que a organização não atuou
sozinha.
"Há uma rede internacional sem a qual estes ataques não poderiam ter sido bem-sucedidos", disse.
Desde o ataque, o país está sob toque de recolher e as redes sociais
foram bloqueadas para evitar a difusão de mensagens violentas.
A maioria das vítimas são do Sri Lanka, mas também perderam a vida cidadãos de países como Austrália, China, Dinamarca,
Estados Unidos, Holanda, Portugal, Reino Unido e Turquia, que se
encontravam em alguma das três igrejas ou três hotéis atacados. Outros
87 explosivos não acionados foram encontrados na segunda-feira em
terminais de ônibus.
Segundo a polícia local, mais de 40 suspeitos foram detidos.
O que se sabe sobre o National Thowheed Jamath?
Vítima de ataques no domingo de Páscoa é velada em Negombo, no Sri
Lanka, nesta segunda-feira (22) — Foto: Gemunu Amarasinghe/ AP
Acredita-se que o NTJ tenha sido criado há cerca de três anos, após um
grupo de jovens muçulmanos radicais se separar de outro grupo islâmico
extremista, o Thowheed Jamath do Sri Lanka.
Segundo especialistas em contraterrorismo, sua base de operações foi
instalada desde então no leste do país, distante da costa ocidental mais
cosmopolita.
Em março de 2017, surgiram as primeiras notícias sobre o grupo, após
seu envolvimento no violento conflito em Kattankudy, uma comunidade
majoritariamente muçulmana próxima da cidade de Batticaloa, onde ocorreu
um dos ataques de domingo.
No ano passado, o grupo foi responsabilizado por uma série de atos de
vandalismo contra templos budistas, como a destruição de várias estátuas
de Buda em Mawanella, na região central da ilha, mas, desde então, não
se ouviu mais falar dele.
Como o grupo está organizado?
Mulher chora durante enterro coletivo nesta terça-feira (23) em
cemitério perto da igreja de Saint Sebastian, em Negombo, na Sri Lanka —
Foto: Athit Perawongmetha/ Reuters
Segundo especialistas consultados pelo programa Newshour, da BBC, a NTJ
é composta quase exclusivamente por jovens e não parece ter uma
hierarquia ou estrutura sólida, nem líderes mais velhos.
De acordo com alguns relatórios, sua principal figura é Mohamed Zahran,
um jovem pregador extremista cujo nome apareceu em documentos de
inteligência que alertavam para a possibilidade de ataques e que,
aparentemente, foram subestimados pelo governo do Sri Lanka.
Alan Keenan, diretor para o Sri Lanka da organização não governamental
International Crisis Group, disse à BBC que, após o vandalismo em
Mawanella no ano passado, a polícia prendeu um grupo de adolescentes
discípulos de Zahran.
O grupo era relevante antes dos ataques?
Militares patrulham área onde um veículo explodiu em Sri Lanka, no dia
seguinte ao atentado que matou centenas no Domingo de Páscoa (21) —
Foto: Eranga Jayawardena/AP Photo
O NTJ é considerado um grupo marginal extremista dentro de uma pequena
minoria religiosa. Só 9,7% da população do Sri Lanka, de cerca de 21
milhões de pessoas, são muçulmanos, diante da maioria budista de 70% das
pessoas no país.
Diferentemente de outros grupos extremistas, sua presença nas redes
sociais também é pequena. Ainda que tenha uma página no Facebook, ela
está há semanas sem ser atualizada, e a NTJ não publica nada no Twitter
desde março de 2018.
O site do grupo também parece estar fora do ar, ainda que não esteja
claro se isso aconteceu antes ou depois dos ataques de domingo.
Qual é sua ideologia?
Até os atentados, a organização era geralmente percebida como um grupo
antibudista que buscava impulsionar o islamismo de forma violenta no Sri
Lanka.
Segundo Keenan, os recentes ataques mostram que a NTJ busca levar o
movimento jihadista global à ilha e fomentar ódio, medo e divisões na
sociedade.
Qual é sua relação com outras organizações extremistas internacionais?
Policiais trabalham na Igreja Católica de São Sebastião em Negombo, no
Sri Lanka, um dos locais alvos dos atentados orquestrados do domingo de
Páscoa — Foto: Athit Perawongmetha/Reuters
O governo do Sri Lanka e especialistas em contraterrorismo dizem que a
forma como os ataques foram organizados, a data escolhida (o domingo de
Páscoa) e a coordenação entre as explosões sugerem vínculos com outras
organizações extremistas internacionais.
O presidente do país, Maithripala Sirisena, disse que agências de
inteligência do Sri Lanka consideram que os ataques foram apoiados por
"organizações terroristas" de outros países.
Especialistas em segurança consultados pela BBC concordam que a
coordenação dos ataques mostra que foram detalhadamente planejados, o
que sugere que a NTJ pode ter recebido "considerável financiamento e
experiência" de outros grupos extremistas de fora do país.
"Agora, estamos investigando o apoio internacional que tiveram, como prepararam os autores dos ataques suicidas e produziram bombas como estas", comentou Senaratne.
Ainda que tais vínculos sejam desconhecidos, especialistas acreditam
que, dada a composição da NTJ (jovens ligados às suas comunidades, mas
sem líderes fortes ou mais velhos), ela se assemelha a outros grupos
locais do mundo muçulmano com os quais o autodenominado Estado Islâmico (EI) buscou formar alianças.
Fontes de inteligência dos Estados Unidos também garantiram que o modus
operandi do grupo é parecido com o empregado tradicionalmente pelo EI,
ainda que outros grupos islamistas radicais como a Al Qaeda também tenha
experiência em organizar e realizar ataques suicidas simultâneos.
Jovens muçulmanos do Sri Lanka lutaram para o EI nas guerras na Síria e
no Iraque e, como o grupo perdeu seus últimos bastiões no Oriente
Médio, acredita-se que muitos de seus combatentes tenham voltado para
seus países.
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